24 novembro 2006

Declaração Universal de Direito dos Povos

Reunidos em Argel por iniciativa da Fundação Lélio Basso para os dirigentes dos povos, juristas, economistas, políticos e dirigentes de movimentos de libertação nacional proclamaram, a 4 de julho de 1976, a DeclaraçãoUniversal dos Direitos dos Povos, divulgada, desde o ano seguinte, em francês, em inglês e em espanhol, e cujo texto aqui apresentamos.

PREÂMBULO
Estamos vivendo tempos de grandes esperanças, mas também de profundas inquietudes: tempos cheios de conflitos e de contradições; tempos em que as lutas de libertação levantaram os povos do mundo contra as estruturas nacionais e internacionais do imperialismo e lograram derrubar sistemas colonias; tempos de lutas e de vitórias em que as nações assumem, entre si ou no seu interior, novos dias de justiça; tempos em que as resoluções da Assembléia Geral das Nações Unidas, desde a Declaração Universal dos Direitos do Homem até a Carta dos Direitos e deveres Econômicos dos Estados, exprimiram a busca de uma nova ordem política e econômica internacional. Mas são também tempos de frustrações e de derrotas, em que novas formas de imperialismo aparecem para oprimir e explorar os povos. O imperialismo, por métodos pérfidos e brutais, com a cumplicidade degovernos que na maioria das vezes se auto-designaram, continua a dominar uma parte do mundo. Pela intervenção direta, ou indireta, por intermédio das empresas multinacionais, pela utilização de políticos locais corrompidos,pela ajuda a regimes militares fundados sobre a repressão policial, a tortura e a exterminação física dos opositores, pelo conjunto de práticas às quais se deu o nome de neocolonialismo, o imperialismo estende sua dominação sobre numerosos povos. Conscientes de interpretar as aspirações de nossa época, reunimo-nos em Argel para proclamar que todos os povos do mundo têm o mesmo direito, se estão subjugados, de lutar por sua libertação, e o direito de contar, na sua luta, com o apoio de outros povos. Persuadidos de que o respeito efetivo pelos direitos do homem implica o respeito pelos direitos dos povos, adotamos a Declaração Universal dos Direitos dos Povos. Possam todos aqueles que, no mundo, travam o grande combate às vezes com armas na mão, pela libertação de todos os povos, encontrar na presente declaração a segurança de que é legítima a sua luta.

Seção I - DIREITO À EXISTÊNCIA
Artigo 1 - Todo povo tem direito à existência.
Artigo 2 - Todo povo tem direito ao respeito por sua identidade nacional e cultural.
Artigo 3 - Todo povo tem o direito de conservar a posse pacífica do seu território e de retornar a ele em caso de expulsão.
Artigo 4 - Nenhuma pessoa pode ser submetida, por causa de sua identidade nacional ou cultural, ao massacre, à tortura, à perseguição, à deportação, à expulsão ou a condições de vida que possam comprometer a identidade ou a integridade do povo ao qual pertence.

Seção II - DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO POLÍTICA
Artigo 5 - Todo povo tem o direito imprescritível e inalienável à autodeterminação. Determina seu estatuto político com inteira liberdade, sem qualquer ingerência estrangeira.
Artigo 6 - Todo povo tem o direito de se libertar de toda dominação colonial ou estrangeira direta ou indireta e de todos os regimes racistas.
Artigo 7 - Todo povo tem direito a um regime democrático que represente o conjunto dos cidadãos, sem distinção de raça, de sexo, de crença ou de cor e capaz de assegurar o respeito efetivo pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais para todos.

Seção III - DIREITOS ECONÔMICOS DOS POVOS
Artigo 8 - Todo povo tem um direito exclusivo sobre as suas riquezas e os seus recursos naturais. Tem o direito de recuperá-los se deles foi expoliado, assim como de reaver as indenizações injustamente pagas.
Artigo 9 - Como o progresso científico e técnico faz parte do patrimônio comum da humanidade, todo povo tem o direito de participar dele.
Artigo 10 - Todo povo tem direito a que o seu trabalho seja justamente avaliado e a que os intercâmbios internacionais se façam em condições de igualdade e eqüidade.
Artigo 11 - Todo povo tem o direito de escolher o seu sistema econômico e social e de buscar a sua própria via de desenvolvimento econômico em liberdade total e sem ingerência exterior.
Artigo 12 - Os direitos econômicos enunciados acima devem expressar-se num espírito de solidariedade entre os povos do mundo e levando em conta seus respectivos interesses.

Seção IV - DIREITO À CULTURA
Artigo 13 - Todo povo tem o direito de falar sua língua, de preservar e desenvolver sua cultura, contribuindo assim para o enriquecimento da cultura da humanidade.
Artigo 14 - Todo povo tem direito às suas riquezas artísticas, históricas e culturais.
Artigo 15 - Todo povo tem direito a que não se lhe imponha uma cultura estrangeira.

Seção V - DIREITO AO MEIO AMBIENTE E AOS RECURSOS NATURAIS
Artigo 16 - Todo povo tem direito à conservação, à proteção, e ao melhoramento do seu meio ambiente.
Artigo 17 - Todo povo tem direito à utilização do patrimônio comum da humanidade, tais como o alto-mar, o fundo dos mares, o espaço extra-atmosférico.
Artigo 18 - No exercício dos direitos precedentes, todo povo deve levar emconta a necessidade de coordenar as exigências do seu desenvolvimento econômico com o de solidariedade entre todos os povos do mundo.

Seção VI - DIREITOS DAS MINORIAS
Artigo 19 - Quando, no seio de um Estado, um povo constitui minoria, tem direito ao respeito por sua identidade, suas tradições, sua língua e seu patrimônio cultural.
Artigo 20 - Os membros da minoria devem gozar, sem discriminação, dos mesmos direitos que os outros cidadãos do Estado e participar com eles, em igualdade, na vida pública.
Artigo 21 - Estes direitos devem ser exercidos mediante o respeito aos legítimos interesses da comunidade em seu conjunto, e não podem servir de pretexto para atentar contra a integridade territorial e a unidade política do Estado, quando este atua em conformidade com todos os princípios enunciados na presente Declaração.

Seção VII - GARANTIAS E SANÇÕES
Artigo 22 - Todo descumprimento às disposições da presente Declaração constitui uma transgressão às obrigações para com toda a comunidade internacional.
Artigo 23 - Todo prejuízo resultante de uma transgressão à presente Declaração deve ser integralmente reparada por aquele que o causou.
Artigo 24 - Todo enriquecimento em detrimento de um povo, por violação das disposições da presente Declaração, deve dar lugar à restituição dos lucros assim obtidos. O mesmo se aplicará a todos os lucros excessivos realizados pelos investimentos de origem estrangeira.
Artigo 25 - Todos os tratados, acordos ou contratos desiguais, subscritos com depreciação aos direitos fundamentais dos povos, não poderão ter nenhum efeito.
Artigo 26 - Os encargos financeiros exteriores que se tenham tornado excessivos e insuportáveis para os povos deixam de ser exigíveis.
Artigo 27 - Os atentados mais graves contra os direitos fundamentais dos povos, especialmente contra o seu direito à existência, constituem crimes internacionais, acarretando a responsabilidade penal individual de seus autores.
Artigo 28 - Todo povo cujos direitos fundamentais são gravemente ignorados tem o direito de fazê-los valer, especialmente pela luta política ou sindical, e mesmo, em última instância, pelo recurso à força.
Artigo 29 - Os movimentos de libertação devem ter acesso às organizações internacionais, e os seus combatentes têm direito à proteção das leis humanitárias da guerra.
Artigo 30 - O restabelecimento dos direitos fundamentais de um povo, quando gravemente desconsiderados, é dever que se impõe a todos os membros da comunidade internacional.

(In: MARQUES, João Benedito de Azevedo. Democracia, Violência e Direitos Humanos. Anexos. São Paulo: Cortez, 1991)

4 comentários:

Humberto Reis disse...

Bah, Romualdo. O texto é sensacional! Vou encomendar este livro.

Ah, talvez seja interessante colocar o link para as resoluções da Convenção de Montevideo, de 1933:

http://en.wikipedia.org/wiki/Montevideo_Convention

http://www.yale.edu/lawweb/avalon/intdip/interam/intam03.htm

Anônimo disse...

olá Romualdo,

encontrei seu blog através do site do mrr que descobri durante uma zapeada na wikipedia, e acabei descobrindo que aí no Rio grande ainda tem movimentos separatistas! Interessante!

Não sou gaucho, sou paulista, portanto, tenho visão um pouco diferente desta história, mas procurarei ser o mais imparcial e o menos conservador que puder... nem sei se é o post certo pra comentar, mas falarei o que penso sobre a revolução farropilha!

Sempre quando tive está parte da história do brasil em aulas de história na escola (que alias, é bem "censurista" quanto as revoluções que ocorreram no Brasil) sempre percebia por parte de meus colegas um espanto, de um estado brasileiro já ter sido um país e coisa e tals ... por incrivel que pareça, nunca tive este espanto, e me pergunto até hoje, como um pais com uma politica tão conturbada como o Brasil ter permanecido praticamente intacto (praticamente pq não temos mais a cisplatina) deste de 1822? pela força, sim, com certeza, mas além disto, acredito que várias desta revoluções que teve, sempre teve um lado provinciano de oligarquias descontentes passageiras, e a revolução farroupilha faz parte deste tipo de revolta, e claro, quando estas oligarquias conseguem uma garantia que seus interesses serão levados em contas, eles desistem!

Ao contrário de outras federações que existe por aí, como a russia,a espanha, o reino unido e a china, que tem dentro de seus território, povos realmente sacramentados com lingua,cultura,demografia completamente distintos e que buscam a séculos a independência, aqui no nosso brasil, nenhum movimento separatista durou mais de 10 anos, e queira ou não, a revolução farroupilha acabou em 1845, deste então, não houve mais movimentos ou revoluções deste tipo atuante, apenas nos ideais, é claro! Ao contrário da Cisplatina, que tem lingua,cultura,demografia e origem diferente do brasil,que bateu o pé e foi até conseguir sua independencia! outros movimentos separatistas como o ETA no pais basco e na chechenia, até hoje continuam atuante, agora , pq o movimento farropilha parou? o mesmo aconteceu com a relução de 32 aqui em sampa ...

Até confesso que o RS seria uma país que existisse até hoje, estária no nivel dos tigres asiáticos , mas será que daria certo?

O que aconteceu com as colonias espanholas, que se partiram em várias tb não funcionou, o Brasil tenta fazer o que o EUA fizeram, manter todas as antigas colonias portuguesas na america unidas pra ve se um dia se ajeita, eles conseguiram, nós, quem sabe!

naquela época, século XIX era a época de ter conseguido a independencia, agora, acho dificil, improvavel, mas só o futuro a Deus pertence!

Não seria mais fácil, ao invés de cada provincia se separar, e todas se unissem num ideal comun em fazer um país melhor, como a austrália e os EUA fizeram? hoje somos unidos apenas no papel, mas cada estado briga um com o outro por impostos,investimentos e por poder . Se surgisse mais 27 paises no mundo, seriam apenas 27 mais para brigar com outros 13 da américa do sul e com outros 210 no mundo ...

enfim, seria o separatismo a melhor solução?

obrigado
Edson

Humberto Reis disse...

Edson, agradeço sua opinião em nome do Romualdo (ele logo virá aqui, mas como cheguei primeiro...).

Cara, entendemos que o federalismo verdadeira já seria uma bela saída para o caos nacional. Ou seja, que a concesão de maior autonomia aos estados contribuiria para amenizar os ânimos de alguns. Outros, entretanto, vêem na separação uma forma de exercer o direito universal à autodeterminação.

A questão não é sentir-se superior ou querer separar-se da parte pobre (como tentar incutir os pró-nacionalistas), mas utilizar-se de critérios culturais e históricos para definir-se como cidadão. Movimentos autonomistas não existem só no RS, mas em SP, MT e todo o nordeste. Aliás, foi no nordeste que surgiu a primeira revolta que deu origem a uma nação independente (a Confederação do Equador).

Anônimo disse...

olá!

Agradeço a atenção que deram ao meu post!

quanto a opinião do humberto, só esclarecendo, não tenho nada contra o separatismo, até defendo o separatisto do país basco e da chechenia por exemplo, pois o sofrimento que estes dois povos passam é algo quase surreal!

A questão não é o RS se sentir superior ou mais rico ou mais importante que o restante do brasil, a ótica que uso não é essa, a ótica que tentei passar é a origem dos movimentos separatistas aqui no brasil.

Todos eles, como a farropilha, a de 9 de julho aqui em sampa e a do equador a do contestado, a de canudos e o cangaço, todas elas, não tiveram um "embalsamento" principal á cultura ou a Declaração de direitos dos povo, mas teve fims econômicos e de interesse de oligarquias provincianas!

A questão que eu tenho como principal, não é renegar o direito de um povo de querer melhores dias, e sim como isso será feito!

Discutirei melhor esta questão no post do romulado!

obrigado!