08 março 2014

TENTATIVA DE DESTRUIÇÃO DA HISTÓRIA DO RIO GRANDE
RESPONDENDO AS RESPOSTAS DO BRASILIANISTA JUREMIR MACHADO
Por Romualdo Negreiros

A dicotomia entre a ciência e a religião é talvez a mais antiga das questões humanas. No entanto até hoje, mais de 10 mil anos depois, ainda não aprendemos a resolvê-la.
A ciência utiliza os cinco sentidos e a capacidade humana de raciocínio, restritos as três dimensões que podemos perceber e entender, e limitados pela velocidade da luz, para solucionar as questões existenciais.
A religião extrapola as fronteiras da ciência e busca explicar o inexplicável para o homem.
Se falamos de algumas áreas do conhecimento onde se aplica puramente a lógica, como a matemática, a química e a física, a ciência considera os limites temporais, ou seja, “não temos hoje condições técnicas de saber, mas no futuro as teremos, então as comprovaremos cientificamente”. É uma questão de tempo.
Há, no entanto, algumas áreas do conhecimento que incluem um elemento não-científico: A INTERPRETAÇÃO! Cito como por exemplo a Literatura, as Artes, e, no nosso caso, a História!
A História baseia-se em fatos concretos. Porém o nossos limites temporais não permitem que os entendamos tais como realmente o foram. Não estão gravados em nossa mente consciente, não os presenciamos, nem podemos presenciar. Mais que isso, mesmo os personagens que daqueles fatos da história fizeram parte, haverão de fazer suas interpretações individuais, e a partir destas interpretações agir, gerando então mais fatos.
Por suas ações podemos deduzir cientificamente qual a interpretação aquele personagem dá aos fatos. Porém, não devemos jamais esquecer que nós mesmos, ao contatarmos com os fatos de nossa história, estamos deles tirando apenas nossas interpretações, e julgando cada personagem e cada ato seu.
Aqui reside a dicotomia da história dos povos. Esquecemos, ou nem nos apercebemos, que os estamos analisando do ponto de vista de nosso tempo, de nossos costumes, de nossa moral, de nosso “momento histórico”, e não do deles!
Porém, podemos da verdade nos aproximar!
Considerando que somos o resultado do processo histórico de nosso povo e de nossa situação geográfica, precisamos consultar, para não incorrer neste erro de interpretação da história, nosso mais puro sentimento.
Sei que os historiadores científicos não só não aceitam como desdenham de quem o considera.
Mas, sabe aquelas coisas que aceitamos prazerosamente como verdadeiro, mesmo sem explicação razoável? Para nós “faz sentido”, embora não tenhamos o conhecimento científico...
Assim é a religião, assim é o sentimento pátrio!
Extrapolamos os fatos comprovados cientificamente. Não os negando, mas os interpretando de forma a “fazerem sentido”, a confirmarem nosso sentimento mais caro e puro! Que existe, queiram ou não!
Os “Senhores” dos Cursos de História se negam a aceitar estes sentimentos, que extrapolam o âmbito da ciência. Daí que, para a mesma história, temos duas ou três interpretações.
Tenho observado constantes trabalhos científicos direcionados a anular ou destruir os sentimentos nativistas do povo gaúcho. Porque não podem conviver com sentimentos nativos sem base científica, como é o gauchismo hoje! Isso os incomoda. Sentem-se ignorados em suas teses acadêmicas. O “culto à tradição” precisa ser destruído!
A história do povo rio-grandense não justifica, segundo estes trabalhos e livros técnicos, a importância e a reverência que os tradicionalistas a devotam. Até entendo! Mas não posso aceitar que estes “Historiadores de Gabinete” fiquem falando sozinhos, sem que alguém assuma a posição contrária, a de uma interpretação gaúcha da história gaúcha.
A se confirmar suas interpretações tecnicistas, as coisas (resultados) não se encaixam na realidade! Tem gente pensando e agindo de forma totalmente errada... O problema é que são muitos... Muitos! Será mesmo que estão todos errados?
Nossa história não pode permanecer sem que se comprove e justifique o amor telúrico que nós gaúchos nutrimos pela nossa pátria gaúcha, sem que devotemos o justo louvor aos nossos heróis.  Precisamos restabelecer a sequência natural entre o passado e o presente do Rio Grande.
Isto por si só justifica este pequeno trabalho de reconsiderar as interpretações feitas pelo historiador Juremir Machado em entrevista ao Jornal Sul21, em Setembro de 2012.
Relendo esta entrevista observei duas qualidades: As perguntas são diretas e abrangem questões capitais desta polêmica, e as respostas do Sr. Juremir, posto que orais, e não escritas, foram concisas e igualmente diretas, indo ao ponto sem delongas.
Minhas considerações e citações são precedidas das letras “RN”, minhas iniciais, para melhor identificação.


Juremir: “muitos comemoram Revolução sem conhecer a história”

O jornalista e historiador Juremir Machado da Silva publicou em 2010 o livro “História Regional da Infâmia”, no qual relata, através de documentos, uma série de fatos pouco divulgados sobre a Revolução Farroupilha. Dentre eles, o de que ela foi financiada com a venda de negros.

Sul21 – Como surgiu a ideia de escrever “A História Regional da Infâmia”?
Juremir Machado – Por muitas razões. Uma delas é a inconformidade com esse culto tradicionalista mal embasado em fatos históricos. Como fiz faculdade de História, tinha acompanhado desde sempre as polêmicas provocadas, primeiro, pelo Tau Golim. Em seguida, por Moacyr Flores, Mário Maestri, Décio Freitas… Todos os historiadores que mexeram com isso foram muito atacados, criticados e, às vezes, até estigmatizados. Mas em determinado momento me veio a ideia de fazer um livro, na medida em que comecei a encontrar documentos que me pareciam interessantes. Um grande amigo meu, Luiz Carlos Carneiro, que tinha sido meu professor de História no cursinho universitário, lá por 1980, tinha se tornado diretor do Arquivo Histórico do RS, que tinha todo o acervo sobre a Revolução Farroupilha. Então pude fazer a pesquisa com toda a tranquilidade. E as pessoas que trabalhavam lá me ajudaram muito fazendo transcrição de documentos.

RN - Primeiro: Pelo início da resposta nos é lícito entender que o Sr. Juremir parte de um pressuposto, que é quase um preconceito: “a inconformidade com esse culto tradicionalista mal embasado em fatos históricos”.
Segundo: Os fatos históricos podem explicar e confirmar um sentimento popular, nunca negá-lo! Isso porque o sentimento pátrio é nativo, ou seja, nasce com a pessoa, e não se baseia em qualquer outro fator exterior, senão de que existe, e ponto final!
Terceiro: Diante de qualquer teoria, por mais absurda que seja, procurando bem podemos encontrar fatos ou documentos que a “comprovam”. Isso no entender de quem quer provar!
Quarto: O Arquivo Histórico do RS é uma instituição aberta e democrática, e está à disposição de todo e qualquer pesquisador, franqueando graciosa e gentilmente seus documentos. O que muito nos orgulha! E não precisava o caro pesquisador de um “testa de ferro”.


Sul21 – Quanto tempo durou a pesquisa?
Juremir - Eu li toda a bibliografia existente e fui às fontes. Li mais de 15 mil documentos e trabalhei com mais de 12 pessoas. Foram três anos de pesquisa com estagiários, bolsistas de iniciação científica, pessoas que contratei em Pelotas, no Rio de Janeiro e em Porto Alegre. Debulhamos 15 mil documentos, alguns que nunca tinham sido trabalhados.

RN - Declaração típica de quem busca os holofotes da mídia!


Sul21 – Que tipo de reações o livro provocou?
Juremir - Meu livro provoca dois tipos de polêmica: aqueles que dizem que tudo é falso e que eu preciso estudar mais; e aqueles que dizem que o livro não traz nada de novo. Isso é falso. É claro que o livro não parte de coisas que ninguém nunca tinha examinado, mas aprofunda muitas dessas coisas e descobre coisas novas. Eu chamo de documento infame toda a documentação referente ao financiamento da Revolução Farroupilha, à compra de munição, de fardamento, de alimentação com a venda de escravos no Uruguai. Ninguém tinha dito que, em determinado momento, por obra de Domingos José de Almeida, a Revolução Farroupilha se financiou com a venda de negros no Uruguai. Em algum momento se falou que teriam vendido alguns negros para comprar uma impressora para o jornal “O Povo”. A venda de negros para financiar a revolução gerou, inclusive, um processo judicial. Depois que deixou de ser ministro da Fazenda, Domingos José de Almeida entrou na Justiça da República pedindo o ressarcimento de tudo o que tinha investido. Ele detalha, briga, insulta e polemiza. Quer de volta o dinheiro dos negros que vendeu. Ele dá os nomes e todas as informações sobre as vendas.

RN - O melhor é que não precisamos ler 15 mil documentos para saber isso! Eles estão transcritos e impressos na Coleção Varela, do Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, em 19 volumes, com Índice Onomástico! Um regalo!
Mas chama atenção um erro crasso, básico, fundamental, cometido pelo ilustre historiador: A interpretação temporal dos fatos históricos.
É primário que saibamos interpretar documentos históricos segundo o ambiente e o momento em que ele foi criado. Naquela época escravo era um bem, uma mercadoria, um objeto de valor! Hoje isso choca e fere nossa sensibilidade, mas era a realidade da época! Como hoje temos um carro, um apartamento, um sítio, na época tinha-se um escravo! Era um bem que se poderia transformar em dinheiro a qualquer momento!
As fontes das verbas que foram utilizadas para financiar a Guerra eram muitas! Não só a venda de escravos. Aliás, esta era a menor de todas! Vendia-se cavalos, o gado, as terras, casas na cidade (vila), pedia-se emprestado, emitia-se letras ao portador, enfim, usavam-se todos os expedientes para que pudessem sustentar a independência do Rio Grande! Inclusive praticava-se o corso, e confiscava-se os bens daqueles que declaradamente eram favoráveis ao Império, contrários à nossa independência, para vendê-los ou arrendá-los! Também uma prática da época.
Infame? Não. Assim era a guerra naqueles tempos! Precisamos vê-la e analisá-la como eles viam e agiam na época!
Os orientais não faziam o mesmo nas guerras por sua independência? O Próprio Bento Gonçalves não perdeu todas as suas posses em terras uruguaias? E por isso os uruguaios são infames?
E, diga-nos Sr. pesquisador, como o Brasil financiou a Guerra que levava contra os gaúchos? Não foi através do trabalho escravo nas lavouras de café e cana-de-açúcar? Além do também trabalho escravo na extração de ouro nas Minas Gerais? E alguém tem coragem de acusar o Império do Brasil de infame ao manter uma dispendiosa guerra no Rio Grande com o trabalho escravo? Claro que não, porque isso era a coisa mais natural na época!
O Domingos de Almeida dispôs de muitos de seus bens (pois era um rico charqueador quando tudo começou) para manter a difícil guerra contra o Império Brasileiro! Inclusive de alguns de seus escravos!
Outros proprietários fizeram o mesmo! Tudo para manter o Rio Grande um país independente dos desmandos do Império! Com certeza eles esperavam, uma vez vencida esta guerra, reaver, se não todo, parte de seus bens! Nada seria mais natural!
Os farrapos eram, então, escravocratas? Não tinham a intenção de libertar os escravos após a guerra, como prometeram? Engano! Erro de interpretação novamente! Mas estas perguntas serão respondidas mais abaixo.


Sul21 – Como era a relação dos líderes da revolução com os negros? Havia uma retórica pretensamente abolicionista e uma prática diferente?
Juremir – Todos eram proprietários de escravos e viviam em uma sociedade escravista. Então eles podiam ser escravistas, seriam simplesmente homens de seu tempo. Mas em outros lugares estavam acontecendo revoltas pela libertação dos negros, como no Maranhão. No Uruguai e na Argentina, o processo de libertação dos negros estava muito mais acelerado. Era um tempo de escravismo, mas não da mesma maneira em todos os lugares. Falamos de Rivera e de Rosas como se fossem caudilhos hediondos, mas eles eram muito mais avançados, progressistas e iluministas. Nossos fazendeiros gostavam de se aliar com eles, mas tinham medo das coisas que eles faziam, como reforma agrária e libertação de negros. Eles eram muito mais adiantados e “perigosos” nesse sentido.
               
Sul21 – Há o mito consagrado de que os farroupilhas eram abolicionistas.
Juremir - Não, eles não eram. Talvez um ou dois tivessem algum ardor nesse sentido. Mas a maioria não era. Eles prometeram liberdade para os negros dos adversários que aceitassem ser incorporados como soldados. Era uma forma de atrair mão de obra militar. Mas os escravos dos próprios farroupilhas continuaram nas fazendas trabalhando para que eles pudessem fazer a guerra. Quando a Revolução acabou e eles voltaram para casa, continuaram escravistas. Quando Bento Gonçalves morre, deixa um inventário com 53 escravos aos seus herdeiros. Escravos valiam muito. Ele morreu rico, com terras, fazendas e escravos. Quando fizeram, em Alegrete, o texto da Constituição, ela não previa a libertação dos escravos. Se eles tivessem vencido e a Constituição entrado em vigor, o Rio Grande do Sul continuaria sendo uma sociedade escravista. Eles não tinham nada de abolicionistas. Claro, em determinado momento, com a mão de obra militar minguando – principalmente quando o Império começou a mandar mais gente -, tiveram de recorrer aos negros dos adversários. O Domingos José de Almeida, além de ter vendido seus negros ao Uruguai para financiar a revolução, para ele mesmo se sustentar como ministro da Fazenda e cérebro da revolução, continuava alugando outros negros no Uruguai e vivendo das rendas desse aluguel. Os negros trabalhavam no Uruguai para que ele pudesse ser o chefe revolucionário. Existem muitos exemplos de situações mais adiantadas de libertação de escravos. No Brasil, no Uruguai, na Argentina, no Chile… Simón Bolivar tinha libertado os escravos. A libertação de escravos estava acontecendo com frequência. Rivera fez isso e nós não. Os farroupilhas não eram abolicionista e não pretendiam ser. Só queriam usar os negros.

RN - Sejamos honestos: Todos sabemos que os gaúchos que lutaram na guerra não fechavam conceitualmente em todas as questões! Tinham um ideal maior, que era a libertação do nosso Estado, mas em questões pontuais haviam divergências naturais, da mesma forma que existem hoje!
Havia um grupo que priorizava a República. Outro grupo, que desejava a Federação (Confederação, para nosso entendimento de hoje). Outro ainda, eram militares descontentes com o sistema militar imperialista. Enfim, haviam 5 ou 6 bons motivos para ir à luta, inclusive a independência do Rio Grande e a consequente “Confederação” com os demais países do Prata.
Porém haviam também, entre os Farrapos, os que preconizavam a libertação dos escravos, bem como os que entendiam que a escravatura deveria continuar (notadamente Vicente da Fontoura). Prova da existência de abolicionistas é a última reunião maçônica antes do início da Revolta Farroupilha, onde se cotizaram para comprar a liberdade de um escravo!
Entendemos que a República era uma idéia nova, ainda não assimilada totalmente por muitos que lutavam por ela! A conscientização da necessidade de se abolir a escravatura é um processo de adequação, não se pode esperar que imediatamente após a Proclamação da República, se obtenha um perfeito sistema republicano, completo e acabado!
A Constituinte, por conta desta diversidade de opiniões, deixou em suspenso esta questão! Mas, com certeza, depois de terminada a Guerra e conquistada a liberdade, deveriam os Srs. Deputados se debruçar sobre este tema para uma decisão final.
Mas independente disso, precisamos entender que o mundo de então, século XIX, era escravocrata! A escravidão de humanos negros existia, era uma realidade, assim era a vida na época! E por obra do Colonialismo português, no Brasil era muito mais forte!
Os escravos eram comprados em leilões, em praça pública. Era um investimento, como hoje compramos uma máquina de lavar roupa! É duro, é triste para nós hoje, mas era a realidade na época... Fazer o quê?
Ora, mesmo que um elemento, digamos, Domingos José de Almeida, fosse contra a escravidão, ele precisaria de trabalhadores para as suas charqueadas em Pelotas, e para a manutenção da sua casa. Investiu dinheiro nisso! Era o modo que, na época, se usava para manter uma casa e uma empresa!
Para fazermos uma analogia mais compreensível, imaginemos um gaúcho, hoje, completamente convicto que o sistema adequado ao Rio Grande e ao mundo, é o socialismo mais puro! Sendo assim ele abomina o dinheiro, o capital, a poupança!
Imagine que, por conta desta convicção, ele deva se desfazer de todo o seu capital, deva recusar receber o seu salário (pois é dinheiro, não?), e ainda deva queimar todas as cédulas que porventura tenha no bolso! Ninguém em sã consciência faria isto!
No entanto este gaúcho não deixa de lado sua convicção que o dinheiro é a perdição da humanidade, muito embora continue usando este mesmo dinheiro, ganho honestamente, em seu proveito! Bem, assim é o mundo!
Da mesma forma, o Domingos de Almeida mantinha seus escravos, comprava-os e vendia-os, como qualquer pessoa daquela época, sem com isso abandonar suas convicções anti-escravocratas! (Pois ele foi um dos que contribuiu, naquela reunião maçônica, para a libertação de um escravo. Para manter as aparências? Não. Naquela época as reuniões maçônicas era totalmente secretas).
Com a Deposição de Armas dos Farrapos ficou acordado em uma das cláusulas que os “financiadores” da guerra seriam ressarcidos de suas despesas, o que não foi cumprido totalmente! Domingos de Almeida entrou na Justiça para que o Império cumprisse esta cláusula, e tentar reaver seus gastos. No que não foi atendido!


Sul21 – Teve o episódio da batalha de Porongos…
Juremir - É curioso… Muitos historiadores reconhecem que houve traição em Porongos, mas não demonstram como isso ocorreu. A maior parte dos historiadores que examina Porongos pula essa etapa. Em determinado momento essa traição era negada. Como os líderes farroupilhas tinham prometido liberdade aos negros dos adversários, com o fim da revolução começam a ficar preocupados e receosos de que os negros possam querer se vingar caso isso não ocorra. Era um contingente expressivo de escravos. Então os líderes farroupilhas estavam numa contradição, já que esses negros pertenciam a adeptos dos imperiais, que os queriam de volta. Foi aí que veio aquela ideia “maravilhosa” de diminuir esse contingente ao máximo e fazer um pacto para eliminá-los. A cilada de Porongos chega a ser simplória. Os negros foram realmente desarmados e dizimados. Canabarro recebeu o aviso de um possível ataque e desarmou os homens, foi tudo muito preparado. Um outro aspecto que o meu livro vai adiante é em relação ao destino dos negros farrapos. Nem todos morreram. Sobraram alguns deles. Uns escaparam, conseguiram fugir a cavalo, e muitos caíram prisioneiros. Sempre se discutiu o que teriam feito com esses negros. Os farroupilhas dizem que Caxias libertou todos, incorporou ao Exército e conferiu a eles uma condição quase de enobrecimento. E alguns diziam que eles tinham sido enviados para o Rio de Janeiro, para a fazenda imperial Santa Cruz.

RN - E este ponto é importante porque joga com o sentimento de racismo, ateando ódio entre negros e tradicionalistas. Não é novidade a existência de documentos que comprovam, através de depoimentos, a FALSIFICAÇÃO da carta de Caxias ao Moringue que supostamente comprovaria a TRAIÇÃO de Canabarro.
Causa estranheza que, entre os 15.000 documentos estudados pelo festejado historiador, não contivesse nenhum destes documentos que revelam a armação que Canabarro sofreu!
Se o Sr. Juremir os leu, fica pior ainda a certeza de que é, de fato, tendencioso à destruição dos heróis Farrapos, ao deixá-la de lado e não referi-la, ao menos, como uma possibilidade.
Para quem deseja saber a verdade, vou reproduzir a Carta que supostamente o Barão de Caxias teria enviado ao Coronel Francisco Pedro de Abreu, conhecido como “Chico Pedro” ou “Moringue”.

Coleção Alfredo Varela - 3730
“Cópia. Reservadíssimo. Ilmo Sr. Regule V. Sa. suas marchas de maneira que no dia 14 às 2 horas da madrugada possa atacar a força ao mando de Canabarro, que estará neste dia no cerro dos Porongos. Não se descuide de mandar bombear o lugar do acampamento de dia, devendo ficar bem certo de que ele há de passar a noite nesse mesmo acampamento. Suas marchas devem ser o mais ocultas que possível seja, inclinando-se sempre sobre a sua direita, pois posso afiançar-lhe que Canabarro e Lucas ajustaram ter as suas observações sobre o lado oposto. No conflito poupe o sangue brasileiro quanto puder, particularmente da gente branca da Província ou índios, pois bem sabe que esta pobre gente ainda nos pode ser útil no futuro. A relação junta é das pessoas a quem deve dar escápula se por casualidade caírem prisioneiras. Não receie da infantaria inimiga, pois ela há de receber ordem de um Ministro e do seu General-em-chefe para entregar o cartuchame sobre pretexto de desconfiança dela. Se Canabarro ou Lucas, que são os únicos que sabem de tudo, forem prisioneiros, deve dar-lhes escápula, de maneira que ninguém possa nem levemente desconfiar, nem mesmo os outros que eles pedem que não sejam presos, pois V. As. Bem deve conhecer a gravidade deste secreto negócio que nos levará em poucos dias ao fim da revolta desta Província. Se por acaso cair prisioneiro um cirurgião ou boticário de Santa Catarina, Casado, não lhe reviste a sua bagagem e nem consinta que ninguém lhe toque, pois com ela deve estar a de Canabarro. Se por fatalidade não puder alcançar o lugar que lhe indico no dia 14, às horas marcadas, deverá diferir o ataque para o dia 15, às mesmas horas, ficando bem certo de que neste caso o acampamento será mudado um quarto de légua mais ou menos por estas imediações em que estiverem no dia 14. Se o portador chegar a tempo de que esta importante empresa se possa efetuar, V, As. Lhe dará 6 onças, pois ele promete-me entregar em suas mãos este ofício até as 4 horas da tarde do dia 11 do corrente. Além de tudo quanto lhe digo nesta ocasião, já V. Sa. deverá estar bem ao fato das coisas pelo meu ofício de 28 de outubro e por isso julgo que o bote será aproveitado desta vez. Todo segredo é indispensável nesta ocasião e eu confio no seu zelo e discernimento que não abusará deste importante segredo. Deus vos guarde a V. As. Quartel General da Presidência e do Comando-em-chefe do Exército em marcha nas imediações de Bagé. 9 de novembro de 1844. Barão de Caxias.
Sr. Coronel Francisco Pedro de Abreu, Comandante da 8ª Brigada do Exército.
Reservadíssima de Caxias [No verso]”

Este Ofício acima é altamente comprometedor! Mas é COMPROVADAMENTE FALSO! Só é levado em consideração, e validado, por historiadores tendenciosos, pretensos “Reis da Verdade”, que buscam as luzes da mídia sobre si.
Vejam o que diz a respeito o Informativo “O Guararapes”, jornal virtual BRASILEIRO de assuntos militares:
“O ofício forjicado sobre Porongos, acusando de traição Canabarro e outros valorosos chefes que com ele estavam em Porongos, foi arquitetado por Chico Pedro depois da surpresa de Porongos e levado a efeito por um major seu subordinado que o forjou e falsificou a assinatura de Caxias.”
Corrobora esta opinião o laureado historiador Henrique Oscar Wiedersphan, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul:
“E a base da acusação foi um ofício bem forgicado (falsificado) por Chico Pedro, como sendo assinado pelo Barão de Caxias para ele, no qual este lhe ordenava que atacasse Canabarro, pois este não resistiria conforme combinação entre ambos. E mais que ele aproveitasse "para atacar e eliminar os mulatos, negros e índios farrapos e poupasse sangue branco."”
Bem, não sou eu que estou dizendo! Tem gente importante, conceituada e insuspeita nos meios acadêmicos que o afirmam: O Documento reproduzido acima, que incrimina Canabarro e o indispõe contra os negros, É FALSO!
Agora, a comprovação.
Relato de Félix de Azambuja Rangel, transcrito na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, 1º e 2º trimestre de 1928, p. 36-47, apresentado também no Livro de Oscar Wiedersphan, Convênio de Ponche Verde, Pág. 71:
"Após a surpresa de Porongos, perto da Quinta do Bibiano estando Chico Pedro acampado no Pequeri, disse ao seu Major de Brigada João Machado de Moraes - És capaz de imitar a firma de Caxias? Respondeu-lhe: A letra é boa e talvez eu possa imitar! Pois vamos fazer uma intriga contra Canabarro. Pois este homem é o único que pode ainda sustentar a Revolução, portanto vamos fingir um ofício de Caxias para mim, dizendo que no dia tal ataque de Porongos, mais ou menos, vá atacar Canabarro e derrotá-lo, visto haver entre ele, Barão de Caxias e oficiais de Canabarro um convênio. Esta intriga foi devido a dizerem os republicanos que Canabarro era um traidor. E assim este distinto general republicano passou a traidor, o que é uma grande ofensa ao seu ilibado caráter e imorredoura memória".
Este mesmo Felix Rangel informa que Chico Pedro foi a Piratini encontrar o Barão de Caxias, para quem mostrou a carta que ele mandara fazer. Caxias não só APROVOU a falsidade, como ASSINOU uma cópia feita na hora! Chico Pedro, então, passou na casa do Professor republicano Manoel Rodrigues Barbosa e mostrou o falso ofício. Este facilmente engoliu a isca, ficou indignado e tratou de espalhar a “traição de Canabarro” para os demais Farrapos, criando grande atrito entre eles!
O depoimento de Manuel Patrício de Azambuja, cunhado de Felix Azambuja Rangel, reforça a verdade:
“Ouvi Chico Pedro, meu comandante, dizer: Produziu bom efeito a bomba que lancei no meio dos farrapos...
E na Quinta do Bibiano eu soube da trama, por Chico Pedro, do falso oficio e imitação da assinatura de Caxias... Em caminho, Felix Rangel expôs-me reservadamente parte do que fica dito e mais tarde me disse o próprio Barão de Jacuí, o Chico Pedro. É que Canabarro era único chefe republicano que realmente tinha verdadeiro prestígio para manter por mais algum tempo a luta, por isso bem compreenderam Caxias e Chico Pedro inutiliza-lo, indispondo-o com os outros generais e seu Exército, o que conseguiram com artificioso plano." Publicado por WIEDERSPHAN, Convênio de Ponche Verde p. 72/73.

Creio que, depois disso, não resta mais suspeitas sobre a conduta de David Canabarro neste episódio.
Mas fica a questão: Estes “grandes” historiadores, detentores do monopólio sobre a história do Rio Grande (Sr. Mário Maestri, Tau Golim, Juremir Machado, e outros) não viram estes documentos?
Como poderiam não ter visto se foram inclusive publicados na Revista do IHGRS em 1928?
E se viram, porque não os levaram em consideração?
Seria uma desconsideração deliberada?

Sul21 – O que aconteceu?
Juremir - Fui atrás e consegui documentos mostrando para onde eles foram. Eles foram entregues pelos farroupilhas e foram transportados. Consegui documentos sobre como eles foram transportados, até com o nome do navio. Eles foram para o Rio de Janeiro, para o arsenal da Marinha.

RN - Consideremos que a Convenção de Ponche Verde não passa de uma manobra para encobrir a vergonhosa derrota que os rio-grandenses sofreram... Inteligentemente, combinaram com os traidores Canabarro (Agora, sim, um traidor da causa Farrapa) e Vicente da Fontoura, esta verdadeira FARSA DE PONCHE VERDE para enganar o povo.
Agora, uma vez “assinada a paz”, o império tomou as rédeas dos negócios a serem resolvidos.
Canabarro entregou os negros, sim. Mas entregou-os com suas armas, ou seja, não como cativos, mas como homens livres!
Veja, os Farrapos não poderiam prometer que os negros que lutassem pela República, seriam libertos caso o Império vencesse. Mesmo assim, lá está no Art. 7 do “Tratado”:
“Art. 7° - Está garantida pelo Governo Imperial a liberdade dos escravos que tenham servido nas fileiras republicanas, ou nelas existam”.
Porém, como era praxe, raramente o Império cumpria com o que prometia. Mesmo com o que suas autoridades assinavam! Aconteceu na Batalha do Fanfa, e repetiu-se no Ponche Verde: Os negros foram entregues para serem libertos pelos imperiais, conforme o Art. 7º, mas bem sabemos que o destino dos mesmos, no Rio de Janeiro, foi bem outro.
"Canabarro entregou 120 soldados negros farroupilhas que o Barão de Caxias alforriou (libertou) com apoio no Decreto de 19 nov 1838 que prometia liberdade a todos os negros farrapos que desertarem e se apresentarem as autoridades imperiais." E a seguir os fez embarcar como livres para o Rio de Janeiro com a condição de não mais retornarem ao Rio Grande do Sul. Mesmo assim se pretendeu no Legislativo do Império se dar ultima forma a estas alforrias (liberdades) ao chegarem os Lanceiros Negros no Rio de Janeiro, sendo efetivadas, somente ante o alarde ocorrido no citado Poder Legislativo de parte do alguns dos mais exaltados da bancada liberal," O Convênio de Ponche Verde, Henrique Oscar Wiedersphan.


Sul21 – Politicamente, havia alguma unidade entre os líderes da revolução?
Juremir - Era um saco de gatos. Antes de 1835 havia gente que oscilava. Bento Gonçalves, por exemplo, era um monarquista, não era republicano. Neto não era republicano. Bento Gonçalves tinha pendores para fazer uma associação com o Uruguai. Ele se relacionava com o Rivera e pensava, volta e meia, em uma perspectiva de junção com o Uruguai. Mas também não era algo muito convicto. Em 1834 aconteceu a principal causa da Revolução Farroupilha: um surto de carrapatos que devorou o gado. Os fazendeiros ficaram com um prejuízo enorme e fizeram exatamente como os pecuaristas fazem hoje em dia: quiseram repassar o prejuízo ao Império. Mas essa ajuda do governo central não vinha. Por outro lado, havia um contexto de muitos militares no Rio Grande do Sul. Em 1831, quando Dom Pedro I abdicou, muitos militares foram mandados para cá, numa espécie de geladeira, porque tinham se insubordinado. Então se juntam esses militares cansados e insatisfeitos com os fazendeiros que se sentiam prejudicados pelo Império. No começo das conspirações, eles só desejam que o Império atenda às suas reivindicações. Alguns querem ver reconstituída sua dignidade militar e serem transferidos para outros lugares. Nossos fazendeiros queriam atendimento às suas reivindicações econômicas. O movimento vai ganhando vida e eles não conseguem mais recuar. Em determinado momento, surge a perspectiva da República, que nenhum dos líderes tinha em mente. No meu livro, publico uma carta que Neto enviou aos vereadores de Pelotas. Ele, que tinha proclamado a República, disse “não sou republicano”. Eles não eram republicanos, mas aos poucos foram sendo empurrados para aquela situação e acabaram proclamando uma República que o Império nunca reconheceu. Para o Império, sempre se tratou apenas de uma província rebelada.

RN - É claro e patente o desdém com que o historiador trata os personagens da história rio-grandense. Percebe-se que não tem sentimento pátrio, e no seu entendimento são todos “burgueses”. A expressão “saco de gatos” (que correta seria “Balaio de gatos”!) ilustra bem este conceito.
Mas nós, simples mortais que, graças à Deus, podemos “ver” a História com relativo equilíbrio, entendemos que em toda a sociedade, em qualquer parte do mundo, há diferentes opiniões sobre os mais variados assuntos. Não era diferente com os Farrapos!
Eles estavam todos unidos em torno de um ideal, de um objetivo, sim. Mas fora deste objetivo, divergiam naturalmente nos mais variados assuntos. Nem por isso ficavam brigando entre si o tempo todo. Apenas discordavam.
Entre os Farrapos haviam várias “correntes” unidas para combater o Império:
                - Os estancieiros e charqueadores por motivos amplamente divulgados e conhecidos;
                - Os militares (muitos deles também estancieiros) pelo descaso do Comando do Exército Imperial;
                - Os negros com a promessa de serem libertos;
                - Os republicanos (na maioria italianos, mas com muitos adeptos no Rio Grande);
                - Os separatistas, que idealizavam o Rio Grande um país independente, unido a outros países independentes na forma Confederativa (uma espécie de Mercosul!).
Precisamos entender que o ideal republicano era, naqueles tempos, uma novidade para a maioria daqueles homens. Originalmente todos eram imperialistas, pois imperialista era o “mundo” que herdaram!
Assim sendo é fácil entender por que alguns rio-grandenses imediatamente se identificaram com as idéias republicanas e outros foram mais resistentes. Alguns, mesmo simpáticos à nova forma de governo, mantinham condutas imperialistas, por força do “status quo”.
Com relação aos separatistas, é preciso saber que, na época, a palavra “Federação” tinha o sentido que hoje entendemos por “confederação”. Portanto nos documentos antigos onde se lê FEDERAÇÃO, entenda-se CONFEDERAÇÃO.
Outro detalhe é que estes “grupos” que constituíam as forças farrapas, citados acima, não eram estanques e separados um do outro. Bento Gonçalves, por exemplo, era militar, estancieiro, separatista e com a influência dos italianos, se tornou também republicano.
Fica difícil entender a história se não levarmos em consideração estes detalhes.
Hoje sabemos, através de pesquisas que serão reveladas brevemente, que o grupo mais influente do início da Revolta, já tinha intenções separatistas desde antes do 20 de Setembro. E que Bento Gonçalves foi fortemente cobrado por sua conduta após a Tomada de Porto Alegre.
Mas isso é outro assunto.


Sul21 – E por que a guerra durou tanto tempo?
Juremir - Quando os liberais estavam no poder, no período regencial, eles, no fundo, gostavam dessa gente daqui. Eles não queriam mandar muito efetivo para cá e deixaram a Revolução correr. Quando finalmente Dom Pedro II ganha a maioridade e os conservadores assumem o poder e passam a ter o primeiro ministro, eles enviam muito efetivo para o Rio Grande do Sul. Então por volta de 1842 já está liquidada a fatura. A revolução se transforma em uma guerra de guerrilhas. Os farroupilhas começam a fugir para todos os lados e, de vez em quando, fazem algumas emboscadas. Quando a coisa ficava muito pesada, todo mundo se refugiava no Uruguai. Foi uma guerra de guerrilhas na qual o exército imperial ficava atrás dos rebeldes e, de vez em quando, tinha algum combate. Houve muito pouco combate e morreu pouca gente. Em dez anos de guerra, morreram 2,9 mil pessoas. Morria mais gente de gripe do que de guerra. Passava meses sem que houvesse combate. Claro que houve momentos de heroísmo e momentos de infâmia absoluta, com estupro, degola, sequestro e execução sumária. É por isso que eu digo que a Revolução Farroupilha foi feita pela Farsul da época com os métodos das Farc. Do ponto de vista ideológico, eles eram a Farsul da época, com uma ideologia liberal incipiente. Eram proprietários rurais em defesa dos seus interesses. E utilizavam os métodos que hoje se condena nas Farc: sequestro, apropriação do gado e das terras alheias.

RN - Segue a tentativa de destruição dos valores mais reverenciados pelo povo gaúcho. Reduz, numa frase, homens de diversas estirpes e ascendências, que lutaram bravamente contra um gigantesco Império, a meros “proprietários rurais”! Será que alguém, em plenas faculdades mentais, acredita nisso?
A despeito da vontade do nobre historiador, e dos “imperialistas” de plantão, a rebelião Farroupilha que começou em 20 de Setembro de 1835, terminou quase um ano depois, a 11 de Setembro de 1836!
Até então eram “rebeldes”. Mas depois de Proclamada a República Rio-Grandense, transformaram-se todos, imediatamente, em “Guerreiros” do Exército Republicano. Passaram então os próximos nove anos, aproximadamente, lutando pela manutenção da independência deste país!
Esta verdade jamais foi aceita pelo Império Brasileiro que, afinal, acabou ganhando a guerra. Ao tornar-se “República” o Brasil continuou ignorando a verdade, e até hoje, os que defendem a versão brasileira dos fatos históricos rio-grandenses, como o grande historiador Juremir Machado, repetem monótonos este mantra mentiroso.
A afirmativa de que guerra durou mais tempo porque os imperialistas liberais “gostavam dessa gente daqui”, é risível!
- A primeira resposta à deposição de Fernandes Braga foi onze brigues e escunas, diversas canhoneiras, lanchas e iates carregados de armamento e muitos soldados, sob o comando do Capitão Grenfell!
- Após a cessação das hostilidades na Ilha de Fanfa, os Farrapos foram traídos, presos, e enviados para a Corte, por Araújo Ribeiro.
- A seguir nomearam o Brigadeiro e Ministro da Guerra Antero de Brito Presidente da Província, com ordens expressas de massacrar com os Farrapos, debelar a rebelião e enviar os líderes à Corte!
- Isso que é “amor”!
A Guerra durou exatos 8 anos, 5 meses e 17 dias entre a República Rio-Grandense e o Império do Brasil e o fato de morrer “pouca gente” não diminui a sua importância. Momentos de heroísmo e infâmia houveram de ambos os lados (aliás, ouso afirmar que o Império realizou mais momentos infames do que heróicos, mas isso também é outro assunto).
E, por fim, o expediente de refugiar-se no Uruguai para recomposição de forças era uma praxe utilizada pelos dois lados, bem como o próprio Uruguai se utilizava desta fronteira em suas guerras pós independência.


Sul21 – Em seu livro, o senhor também aponta casos de corrupção entre os líderes farroupilhas.
Juremir – Quando eles se reúnem em Alegrete para fazer a Constituição, estavam totalmente rompidos. Antonio Vicente da Fontoura pertencia à chamada minoria. Ele havia sido ministro da Fazenda, sucedendo Domingos José de Almeida. Quando ele assumiu o Ministério, constatou que a corrupção corria solta. Ele descreve isso fartamente em seu diálogo e os historiadores nunca quiseram dar muita atenção. Os farroupilhas pegavam a fazenda de um adversário e arrendavam e o lucro desse arrendamento desaparecia. Até Neto foi acusado por Antonio Vicente da Fontoura de ter desaparecido com dinheiro. Um dos grandes problemas da Revolução Farroupilha foi a corrupção. Eles brigaram e se separaram por causa disso. O duelo entre Bento Gonçalves e Onofre Pires tinha na sua base acusações de corrupção.

RN - Aqui está, dita pelo próprio historiador, a comprovação de que os Farrapos perderam a guerra mais por conta de alguns traidores da causa, do que pelas armas propriamente.
Vicente da Fontoura e seu irmão Paulino promoviam a intriga e a discórdia entre os irmãos Farrapos, acusavam, difamavam, obrando assim indiretamente em favor dos interesses do Império.
Bento Gonçalves: “Sei que o célebre Paulino Fontoura está ligado com os imperiais e incumbido de manter a cizânia entre nós escrevendo a uns e a outros com seu acostumado sofisma de retórica confusa. Sei que V.Exa. (Gen. João Antônio da Silveira) o conhece como eu, mas se ele escrever por aí algumas cartas o previno para que faça destruir as doutrinas daquele homem sem caráter e mentiroso sem pejo...”

- Envenenou Onofre Pires contra seu primo Bento Gonçalves, que redundou na morte de Onofre.
- Como Deputado Constituinte usou a tribuna para atacar ferozmente a figura do Presidente, provocando uma divisão irremediável na Assembléia, e a saída de Bento da Presidência.
- Como Ministro tratou de difamar e acusar levianamente Domingos José de Almeida, o homem que se entregou totalmente à República, terminando a vida solitário e pobre.
- Como Embaixador da República foi ridicularizado e humilhado perante a Corte no Rio de Janeiro, e saiu de cabeça baixa e o rabinho entre as pernas.
- Ainda se inimizou e difamou o mais robusto alicerce da criação da República Rio-Grandense, Mariano de Mattos.
- Ao final foi o único articulador da deposição de armas farrapas, contra a vontade dos principais líderes que a iniciaram, entregando de bandeja nosso país nas mãos do inimigo!
Domingos de Almeida à Chevalier: “Fontoura, esse perverso vendido ao Governo do Brasil, já deixou de envergonhar a República, descendo do Ministério que manchou, e de onde promovia o enterro da causa rio-grandense, a tanto custo sustentada desde 1835.” – CV-618, Anais do Arquivo Histórico nº 3, pág. 57.

Este homem, Vicente da Fontoura, foi um verdadeiro “câncer” no organismo farrapo, que acabou por “matar” a República Rio-Grandense. Suas palavras eram doces à República, mas suas ações a destruíam.
Agora pergunto, porque o Sr. Juremir só “ouve” e dá créditos ao que o crápula do Vicente da Fontoura escreve, e não considera minimamente as consistentes defesas de Domingos José de Almeida?
Os leitores tirem suas conclusões.


Sul21 – Como se pautaram as relações dos farroupilhas com as lideranças uruguaias e argentinas? Havia, de fato, a intenção de se criar uma república que anexasse o território do Uruguai e algumas províncias da Argentina?
Juremir – Quando viram que Rivera estava libertando escravos e que tinha propensões à reforma agrária, a parceria deixou de ser interessante. A Revolução Farroupilha foi uma espécie de golpe militar. Esse golpe militar sofreu muita influência platina. Houve muita influência desses caudilhos uruguaios e argentinos. Mas depois houve momentos de aproximação e de separação. Essas alianças só não prosperaram definitivamente porque os líderes farroupilhas eram muito mais conservadores que os caudilhos uruguaios e argentinos. Rivera queria uma revolução benéfica para a população uruguaia. Bento Gonçalves e sua turma só entraram em ação por causa dos seus interesses particulares.

RN - A bem da verdade precisamos colocar as peças do quebra-cabeças no seus devidos lugares:
- Vicejava ainda entre o povo, e Bento Gonçalves não era indiferente, os ideais artiguistas, embora o próprio Bento tenha lutado contra Artigas como Coronel do Império. Seu compadre Lavalleja e Oribe trataram de manter vivo este ideal.
- A idéia de Artigas era constituir vários países independentes, mas unidos em Federação. Incluindo aí as províncias brasileiras que se tornassem Repúblicas independentes.
- Rivera é, hoje, odiado pelo povo uruguaio!
- Bento manteve relações diplomáticas com ele, de Presidente para Presidente, mas a parceria se tornou desinteressante no momento em que percebeu que Rivera fazia “jogo duplo” entre a República e o Império. Inclusive entregando os planos dos Farrapos para os imperiais.
- O Império brasileiro financiava Rivera, e o mantinha no poder ajudando a resistir aos inimigos!
- A “revolução benéfica” de Rivera era entregar de bandeja o povo uruguaio ao Império, pois ele era imperialista, do mesmo modo que Canabarro e Fontoura acabaram fazendo com o povo rio-grandense!
- Quer acredite o Sr. Juremir ou não... Ele não vai mudar os fatos!

Sul21 – Como se deu a construção dos mitos em cima da Revolução Farroupilha?
Juremir - São várias etapas. Uma delas é quando Julio de Castilhos e os republicanos positivistas estão trabalhando pela construção da República no Rio Grande do Sul. Julio de Castilhos vai estudar direito em São Paulo e manda uma carta dizendo que é preciso estudar aquela guerra civil, porque ela poderia servir de fundamento para o que hoje nós chamaríamos de construção de uma identidade regional. Na época, a Revolução Farroupilha era chamada de guerra civil. Esses republicanos positivistas tinham bem a noção de que uma identidade se constrói a partir de um mito fundador. Então era preciso uma mitologia épica para construir essa unidade. Isso foi fartamente explorado. Depois, historiadores como Varela e Alfredo Ferreira Rodrigues ajudaram a construir uma ideia épica de revolução, influenciados pela perspectiva histórica dominante no século XIX. Nos anos 1930, os militares ligados ao Instituto Histórico e Geográfico fazem, em plena Era Vargas, uma recuperação dos fatos com interesse cívico de engrandecimento das atitudes militares. O interessante é que a Revolução Farroupilha foi feita por militares e escrita por militares.

RN - Essa resposta não faz o menor sentido.
Todo mundo sabe que o Positivismo não é Bairrista. Ele se encaixa em um país, nunca numa pequena região deste país. Assim, o positivismo buscava, após a Proclamação da República Brasileira, construir uma identidade brasileira! Através de reconstrução da história brasileira como um todo, não só restrita ao Rio Grande!
Então por que Julio de Castilhos, Presidente de uma Unidade da Nação, haveria de desenterrar uma história regional, uma guerra travada contra o Império, e assim criar os mitos regionais que haveriam de confrontar a própria história brasileira? E ainda constituir uma identidade própria regional, em separado da identidade brasileira construída a muito custo pelos próprios positivistas da Capital Federal? Não faz nenhum sentido!
A verdade é que ele era um homem inteligente e observador. Mais além de sua convicção positivista, ele viu que o Rio Grande (mais naquela época do que agora) não se encaixava na propalada identidade nacional brasileira. Morando e estudando em São Paulo, foi-lhe fácil perceber a enorme diferença entre os costumes, a cultura, a própria história do Rio Grande, em relação aos brasileiros.
Viram, Julio de Castilhos e demais positivistas gaúchos, que seria um grande erro forçar a natureza do povo desta região a copiar o modo brasileiro de ser. Ele próprio sentia-se um “estranho no ninho”, longe da terra que tanto amava. Essa é a grande sacada!
Se analisarmos com mais cuidado, veremos que o Sistema positivista de governar se encaixa perfeitamente em um país com um tamanho médio (não gigantesco como o Brasil), e que seja habitado por um povo culturalmente homogêneo... Uma nação! O Rio Grande era o cenário perfeito para a aplicação efetiva deste sistema.
E foi justamente durante este período dos Caudilhos positivistas rio-grandenses, até a Era Getúlio (1937), que o Rio Grande teve o seu período mais fértil, de maior desenvolvimento, de maior pujança!
Pergunta: Os positivistas criaram fatos históricos e constituíram do nada uma identidade gaúcha? Claro que não. Eles apenas fortaleceram nossas raízes históricas e culturais já existentes, e a partir desta base legítima cresceu uma grande árvore nacional, com um forte tronco cultural e imediatamente rendeu muitos e muitos frutos. Bem ao estilo do sistema positivista propagado por Comte!
Os “historiadores de gabinete” estão inventando a roda quadrada, para serem originais!


Sul21 – E qual o papel dos historiadores na desmistificação da revolução?
Juremir – Os grandes historiadores estão desmistificando a Revolução Farroupilha. Nomes como Tau Golin, Moacyr Flores, Mário Maestri, Sandra Pesavento, Margeret Bakos, Décio Freitas… Moacyr Flores talvez seja aquele que trabalhou mais intensamente a Revolução Farroupilha. O livro “O Modelo Político dos Farrapos” é um marco na desmistificação. Tau Golin fez uma espécie de panfleto que teve muito impacto, questionando se Bento Gonçalves seria herói ou ladrão. Margaret Bakos trouxe muitos dados sobre a condição do negro na Revolução Farroupilha. São esses os caras que realmente têm escrito coisas importantes sobre a Revolução Farroupilha. Se fosse na França, esse pessoal estaria sendo destacado. Mas aqui é o inverso. Talvez porque o Rio Grande do Sul, como qualquer lugar, precisa de um mito fundador. E o que tem à mão é esse. A história, nesse sentido, estraga um pouco este prazer. Os fatos históricos não confirmam toda essa grandeza.

RN – Onde se lê, na resposta do Sr. Juremir, “desmistificando”, leia-se: “Destruindo”!


Sul21 – O que significa hoje comemorar a Revolução Farroupilha?
Juremir – Vale lembrar que a comemoração da Semana Farroupilha, tal qual a fazemos hoje, começa em dezembro de 1964. É uma obra da ditadura militar. O patriotismo servia muito bem nessa época. Acho muito interessante a ideia de que essas pessoas se reúnem para comemorar outra coisa. Comemoram um ideal de vida agropastoril, uma nostalgia da vida no campo, quando éramos realmente gaúchos e tínhamos estâncias. Há também o gosto de estar junto, de conviver e ter algo a compartilhar – algo que o sociólogo francês Michel Maffesoli chama de “tribalismo”. Esse fenômeno pode estar no escotismo, numa torcida de futebol, ou nesse congraçamento anual onde todos se encontram e brincam um pouco de casinha, como dizia Flávio Alcaraz Gomes. A Revolução Farroupilha surge como uma espécie de cimento para fortificar esse interesse de estar junto. Mas ela também tem um componente ideológico conservador. Muitos dos que estão comemorando a Revolução Farroupilha não conhecem grande coisa da sua história. Se for examinar no detalhe, eles não sabem. Conhecem a cartilha do Movimento Tradicionalista Gaúcho, que só destaca aquilo que exclusivamente lhes convém.

RN - O que é, realmente, uma coisa muuuito estranha! Ou é um fenômeno sociológico desconhecido e raríssimo, ou o Sr. Juremir está completamente equivocado na formulação de sua tese.
Prefiro ficar com a segunda opção.
A comemoração da Semana Farroupilha, tal qual a vemos hoje, é o produto de uma evolução natural, com início em 1947, no Colégio Julinho, em Porto Alegre. O combustível principal que agiganta e aprimora esta festa tradicional ano a ano é, sem dúvida, o sentimento de pertencimento a este grupo étnico único, próprio da região. Não um grupo inventado e constituído por “criadores iluminados” como quer ver o Sr. Juremir.
O tradicionalista que está “brincando de casinha” no Acampamento, é, e sente que é, um legítimo representante da história do nosso povo. Não são as tábuas costaneiras, nem a suas pilchas, mas ELE é! O seu sentimento, o seu estilo, o seu modo de ser, de agir, de viver. Porque isso está impresso em sua alma, vem no coração, no âmago do sentimento pátrio, que infelizmente o Sr. Juremir parece não ter! Entreviste-o, e saberás!
Tão arraigado está este sentimento no íntimo de cada gaúcho, que ele não precisa conhecer em detalhes e picuinhas a nossa História. Ele não precisa que lhe digam “como ser gaúcho” e “por que ele é gaúcho”! Ele sabe e age por intuição! Pelo simples prazer de ser!
E olhe que coisa maravilhosa: mesmo por intuição íntima e individual, o gaúcho da fronteira pratica o mesmo tradicionalismo empírico do gaúcho da Serra. O Gaúcho da cidade é tão gaúcho quanto o das Missões. Ou ainda, todos no Rio Grande são os mesmos gaúchos que os de outras paragens e até outros continentes! Tão gaúchos quanto os nossos campeiros!
Não é um fato transcendental?
O gaúcho rio-grandense forma uma nação completa e independente de qualquer outro grupo étnico existente no planeta. Mesmo que seja constituída de elementos culturais variados e adaptados de outras “culturas-mães”. Tem esta etnia todos os elementos básicos e periféricos para se constituir no cimento social de um povo. Com conhecimento de sua união natural, este povo pode sim, e deve, se tornar uma verdadeira nação. É o próximo passo!
Em 1947, Paixão Cortes está cansado de repetir, os “oito bombachudos” só queriam relembrar suas vidas de estância, suas pilchas, seus cavalos, o chimarrão diário. Nada mais que isso! Pensaram em lembrar e homenagear os heróis que lutaram bravamente na Guerra dos Farrapos. Nada foi criado “do nada”. Eram coisas comuns para aqueles estudantes que viviam longe de suas casas e suas famílias. Fizeram então algumas atividades comemorativas ao 20 de Setembro.
O primeiro desfile: Acompanharam pilchados e de à cavalo o translado dos restos mortais de David Canabarro. A primeira Ronda Crioula, o primeiro baile “fandango”, no encerramento. Dali a idéia foi se expandindo. Criaram o primeiro CTG, o 35. Depois outros, aderindo à tradição, foram criando outros CTG’s.
Nos anos 70 os desfiles militares brasileiros de 7 de Setembro ganharam força.  Os militares passaram a utilizar a Av. Loureiro da Silva, a 1ª Perimetral, onde após o desfile oficial, desfilavam os integrantes dos CTG’s, com a Chama Crioula.
Não demorou para que organizassem seu próprio desfile no dia 20 de Setembro, data mais adequada. Como o desfile se dava pela manhã, alguns tradicionalistas (os que moravam mais longe) começaram a vir para o local no dia anterior, acampar, para se paramentar e se preparar, no outro dia, com tranquilidade.
O Parque Harmonia ainda não existia, era apenas um lugar ermo e sem estrutura. Mas já os pioneiros vinham acampar, traziam suas barracas e tralhas de carro ou camioneta, e outros de à cavalo e até mesmo carroça. Eram verdadeiros “Piquetes” avançados dos CTG’s.
Ao fim da tarde do dia anterior ao Desfile, já prontas suas barracas, se reuniam em singela roda de chimarrão. A charla corria solta. Não faltou quem trouxesse gaita, violão, pandeiro. Já toda a gauchada ficava reunida em torno do fogo de chão, saboreando um bom churrasco, iluminados por lampiões de “liquinho”.
Assim começou o Acampamento Farroupilha, assim começou o desfile de 20 de Setembro, de forma espontânea e natural, levado pelo sentimento telúrico e a necessidade de expressão cultural de sua gente.
Dizer que foi obra e graça da Ditadura Militar é uma pecha que o povo gaúcho não merece, e não engole.


Sul21 – Qual o papel da mídia na consolidação do mito?
Juremir – A mídia precisa adular esse público para poder fidelizá-lo. É uma estratégia de marketing que reforça os mitos e dificulta a desconstrução feita pelos historiadores. O interesse da mídia nessa questão é meramente comercial. É uma estratégia de reforço de algo que é caro ao público. Ninguém quer brigar com boa parte do Rio Grande do Sul. É melhor dar uma adulada e deixar os universitários e acadêmicos falarem outras coisas. Se o público está feliz, por que estragar o prazer? Além de tudo, a mídia é conservadora. Muitas vezes os jornalistas compartilham esses valores e acreditam nessas histórias porque foram formados nessa matriz. Tudo isso entra no mesmo caldeirão e, ano a ano, as vozes dos historiadores ficam praticamente inaudíveis.

RN - Mas a voz do Sr. Juremir se ouve longe... Por que será?


Sul21 – O Rio Grande do Sul tem uma relação mais intensa com seus mitos do que outras regiões do país?
Juremir – Talvez, até pelo tipo de construção história do Rio Grande do Sul, com tantas guerras de fronteira. Vários movimentos e situações se aproveitaram disso: a República, os anos Vargas, a ditadura militar e o crescimento do movimento tradicionalista.

Sul21 – Isso contribui para uma imagem mais arrogante do Rio Grande do Sul nos outros estados brasileiros?
Juremir – Isso é algo que só nós enxergamos. Os cariocas acham esse negócio de Semana Farroupilha quase ridículo, uma espécie de carnaval a cavalo.

Sul21 – E o nosso hino? Cantamos um hino que fala em uma “ímpia e injusta guerra”.
Juremir – Nosso hino é racista, ainda por cima, quando diz que “povo que não tem virtude acaba por ser escravo”. É um insulto àqueles que lutaram com os farroupilhas e foram atraídos a eles com a promessa de liberdade.

RN - Estranha ilação. Só mesmo uma mente desequilibrada para a esquerda pode ver racismo no nosso Hino Rio-Grandense! Mas saiba o Sr. Juremir que este hino que cantamos não é o legítimo, feito pelos Farrapos, como Hino Nacional da República Rio-Grandense. Nem a letra, nem a música.


Sul21 – Até hoje, o senhor ainda recebe críticas por causa do livro?
Juremir – Alguns historiadores preferem se afastar desse tema. Cansam de brigar e ouvir insultos. Eu mesmo sofri todo tipo de desqualificação. Diziam que eu não sou historiador e que o meu livro só requenta outras informações. Na época que saiu o livro, a Farsul ameaçou me processar, até por um mal entendido. Acharam que eu tinha dito que a Farsul tinha os métodos das Farc. O que eu disse, na verdade, foi que os farroupilhas tinham a ideologia da Farsul e os métodos das Farc. Recebi e-mails e torpedos de pessoas dizendo que iam me capar. Senti hostilidade em muitas situações. Já perdi a conta do número de insultos que recebi por e-mail, Twitter e Facebook. O maior insulto é a tentativa permanente de desqualificação do teu trabalho.

RN - O maior insulto, Sr. Juremir, é o seu livro. É a tentativa de desqualificar um povo que possui, por sua natureza, uma bela e pacífica cultura. Desacultuá-lo para, quem sabe, escravizá-lo com sua ultrapassada ideologia comunista, onde todos são iguais, mas alguns são mais iguais que a maioria. O Sr. e os demais que vendem as mesmas mentiras podem dormir tranquilos, o povo gaúcho é bairrista, mas não é fundamentalista.
Mas eu, pelo contrário, não vou insultá-lo mas apenas agradecer.

Agradecer a oportunidade de, respondendo estas suas respostas, poder mostrar que é possível, e até recomendável, que observemos nossa história gaúcha, no todo e em aspectos pontuais, do ponto de vista do próprio povo gaúcho. Se afirmamos, como estamos convictos, que toda a história de qualquer país do mundo é tendenciosa, que tenhamos então a coragem de reescrever, nós mesmos a nossa história, com a tendência do nosso ponto de vista, e descartemos absolutamente estas interpretações mesquinhas e destrutivas, de sua visão distorcida por esta ideologia ultrapassada e falida.